André Gago


Who’s There?  
Uma das coisas que me mantém vivo — estar vivo é apenas uma das muitas formas de irmos dando cabo de nós — é esta surpreendente crença naquilo que se poderia comparar a um milagre, mas bastante mais plausível do que um milagre, por dispensar o artifício engenhoso, mas redutor, da religião: faria, simplesmente, todo o sentido que me batesses agora à porta. Seria, aliás, a única coisa que faria algum sentido, afinal, porque daria enfim sentido a tudo. Para ti, e para mim. Tu sabes que é assim. Mas, entre o instinto, que te deixa de pé atrás, e a intuição de uma bela coisa, hesitas, sabendo todavia que assim sobreviverás, pela certa. Passamos bem sem aquilo que parece poder ser uma má ideia. Mas as boas ideias precisam de tempo, e eu talvez já cá não esteja quando tu bateres à porta. Talvez nem tu cá estejas então, quando essa evidência amadurecer por si. E, no entanto, a ruína de tudo exaltará a espera desse instante, maior do que o tempo, maior até do que o amor que se possa encontrar nos seus escombros. O que poderia ter sido. O que deveria ter sido. O que foi, ainda, mas sonhado apenas. Não saberia prometer-te o amanhã, se agora batesses à minha porta (como devias, porque te espero, incansável). Mas sei exactamente como será se não vieres nunca, e viveria feliz, talvez, se o não soubesse.




Texto : André Gago
Foto : Estelle Valente

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